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EAA | Coletânea Soluções Extrajudiciais de Conflitos - A Ancoragem e seus Efeitos na Negociação - Tema 06/13

EAA | Coletânea Soluções Extrajudiciais de Conflitos - A Ancoragem e seus Efeitos na Negociação - Tema 06/13

10 . 10 . 2018 Publicado em Artigos

Nos dizeres popularmente conhecidos, “a primeira impressão é a que fica”. O problema é que poucos se atentam ao fato de que uma primeira impressão mal embasada pode ser o fator determinante para o insucesso de uma negociação (ou mesmo de outras formas de solução de conflito como mediação ou conciliação).

Nos estudos sobre negociação a famosa “primeira impressão” é conhecida como ancoragem. Trata-se de um primeiro valor que as partes envolvidas em certo problema dão àquela situação, que pode ser fixado com base em diversos motivos. O que ocorre então é que a parte se apega ao que estipulou em sua mente no início e muitas vezes se recusa a abrir mão da crença de que aquele valor é o único aceitável para colocar fim à situação.

Porém, muitas vezes as partes deixam de firmar um bom acordo porque alguém está sofrendo os efeitos da ancoragem e se recusa a analisar outros aspectos das propostas oferecidas que, ao final, poderiam lhe gerar um valor global igual ou até maior que o desejado de início.

Ensina Russell Korobkin[1] que[2]: “Quando é pedido às pessoas que deem valor a alguma coisa – seja um bem, um serviço ou um conjunto de termos colocados em um acordo negociado – elas frequentemente determinam esse valor cognitivamente, começando com um ponto de referência preexistente e ajustando a partir daí. (…) esse tipo de informação pode ancorar as avaliações das partes e, assim, indiretamente impactar nos valores de reserva, mesmo quando isso não é logicamente relevante.”[3].

O que isso quer dizer?

Primeiro que quem instrui as partes que irão tentar entrar em alguma espécie de acordo deve sempre orientá-las corretamente desde o início, para que não se apeguem a valores desarrazoados e sem embasamento, de maneira a, desde o começo, formar suas convicções com base na situação real e em todos os aspectos abrangidos pela negociação que irá ocorrer.

Por exemplo: se além de discutir um pagamento devido, também está em jogo a posse de um imóvel, as partes devem ponderar que, no todo, talvez a posse do imóvel valha mais ou menos a pena que o valor desejado. Assim, pode ser que seja interessante abrir mão de uma parte do valor que deseja receber, para garantir a propriedade do imóvel.

Todas as possibilidades do acordo devem ser apresentadas e analisadas desde o princípio, pois isso auxilia a parte e manter todas as opções em jogo, sem descartar uma oferta interessante porque não condiz com alguma ideia preconcebida e desarrazoada.

O texto citado acima fala em valores de reserva. Esse termo diz respeito ao que as partes criam como parâmetros mínimos e máximos ao participar de uma negociação. Quem negocia deve sempre ter em mente o máximo que deseja ganhar (considerando o que é razoável no caso concreto) e também o mínimo que aceitaria receber.

Esses dois parâmetros também são influenciados pela ancoragem, reforçando a necessidade de uma boa analise inicial de tudo que pode ser possível e plausível como resultado de uma negociação.

Portanto, os que desejam estar bem preparados para uma negociação devem fugir ao máximo da ancoragem, especialmente sem fundamentação. É difícil anulá-la por completo, mas é perfeitamente possível atrelá-la a resultados possíveis e fundamentados na situação de fato a ser resolvida. Para que isso ocorra o auxílio de pessoas sem envolvimento emocional no caso é fundamental. Profissionais da área do direito são aconselháveis, pois possuem expertise para analisar as consequências jurídicas que podem decorrer do insucesso ou do sucesso da negociação.

Seja como for, as partes devem sempre se atentar ao viés psicológico que recai sobre toda e qualquer forma de solução de conflitos, tentando se desapegar ao máximo do emocional e se atentar ao racional, para otimizar resultados.

[1] Negotiation – Theory and Strategy. 2nd Edition – Wolters Kluwer Law & Business. Pages 59/60.
[2] “When people are required to place a value on something – be it a good, a service, or a set of terms embodied in a negotiated agreement – they often determine that value cognitively by beginning with a preexistent reference point ant them adjusting from that point. (…) this type of information can anchor parties’ evaluations and, thus, indirectly impact reservation prices, even, when it is not logically relevant.”
[3] Tradução livre da autora.