Publicações / Artigos

Tendência de desjudicialização e perspectivas legais

Tendência de desjudicialização e perspectivas legais

Escrito por Fernanda São Pedro Gusmão . 04 . 04 . 2023 Publicado em Artigos

Por Fernanda Gusmão

A sociedade brasileira está habituada a acionar o Poder Judiciário para solucionar conflitos, pois há uma ideia posta de que o acesso à justiça é viável unicamente por meio da intervenção do Judiciário.

É inegável que o poder judiciário está sobrecarregado e incapacitado de atender a todas as demandas de forma célere e eficaz. Assim, buscar meios alternativos à judicialização de solução de conflitos a fim de garantir o acesso à justiça se mostra fundamental e a desjudicialização pode ser uma ferramenta importante nessa trajetória.

Segundo o CNJ, desjudicializar significa reverter a judicialização excessiva a partir da prevenção, localizando a origem do problema e encontrando soluções pacíficas por meio de técnicas de conciliação ou mediação com atores do sistema de justiça, sem que cause impacto no acesso à justiça. Prezando pela qualidade da solução e não quantidade.

A cultura litigiosa é algo decorrente da própria Constituição Federal de 1988, que estabelece a garantia de inafastabilidade do controle jurisdicional. E essa previsão tem uma razão de ser, uma vez que a Constituição de 88 vem de um período pós ditadura militar, portanto, início de uma caminhada de redemocratização, na qual se buscava ampliar ao máximo o acesso do cidadão ao Poder Judiciário, tendo em vista que no período anterior a sociedade estava tolhida de exercer ou buscar os direitos que lhe cabiam.

Houve uma evolução dessa temática ao longo dos anos e a compreensão de que o acesso à justiça não está resumido e restrito à ação do Poder Judiciário vem ganhando espaço gradativamente. A desjudicialização faz parte de verdadeira orientação do CNJ, no sentido de que os órgãos judiciários ofereçam mecanismos de soluções de controvérsias, especialmente os consensuais, bem como prestar atendimento e orientar o cidadão; antes da solução adjudicada (solução imposta pelo Judiciário) mediante sentença.

Além disso, há que se ter atenção não só aos mecanismos de soluções de controvérsias consensuais, mas também às ações que consigam identificar a origem do excesso de litígios, bem como atuar na prevenção no âmbito social; desconstruindo a ideia de que litigar é buscar justiça.

Diante desse cenário, ações e inovações legislativas vêm surgindo nesse sentido, como exemplo podemos mencionar a Lei nº 14.382/2022 que propõe a modernização dos cartórios extrajudiciais, instituindo o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (Serp), tratando também das incorporações imobiliárias e loteamentos, bem como trouxe a possibilidade de alteração de nome e sobrenome diretamente junto aos cartórios.

O excesso de judicialização está intrinsecamente ligado à capacidade da sociedade em resolver conflitos entre si, sem buscar a intervenção de um ente estatal. De certa forma, pode-se dizer que desjudicializar compõe um movimento de várias frentes, que contribui para o próprio desenvolvimento da sociedade.