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Terceirização: breve relato sobre a evolução no Brasil

Terceirização: breve relato sobre a evolução no Brasil

Escrito por Francine da Silva Polez . 21 . 02 . 2024 Publicado em Artigos

Por Francine Polez

Introdução 

O presente artigo tem como objetivo demonstrar com brevidade a evolução histórica da terceirização no Brasil, com ênfase nas inovações trazidas pela Lei 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista e na repercussão do tema na jurisprudência até os dias atuais.   

Origem da palavra 

Antes de adentrar ao tema central, avalio importante esclarecer a etimologia da palavra terceirização no meio jurídico ligado ao Direito do Trabalho e ainda como é constituída essa relação.  

O termo vem da palavra terceiro, o que nos leva ao entendimento que haverá um intermediário na relação havida entre empregado e empregador, conforme ilustração abaixo: 

 

 

 

No Direito do Trabalho, a terceirização além de incluir uma empresa terceira na relação contratual, também possibilita que o contratante, denominado como tomador dos serviços, não seja responsável pelos direitos e encargos trabalhistas, que recaem sobre a empresa terceira, denominada como prestadora de serviços.  

Assim, o tomador de serviços estabelece um contrato com o prestador de serviços para o fornecimento de mão de obra, havendo entre eles um contrato comercial e sobre a relação havida entre a empresa prestadora dos serviços e o trabalhador, uma relação de emprego que envolve todos os direitos e encargos previstos na legislação trabalhista. 

Importante esclarecer, que desde que preenchidos todos os requisitos para validade da terceirização, entre o tomador de serviços e o trabalhador inexiste qualquer relação de emprego. 

 

Terceirização 

A terceirização surgiu no Brasil no século XX, inicialmente no âmbito público, com o Decreto Lei 200/67 e a Lei 5.645/70, sendo incorporada em 1974 no âmbito privado com a chegada da Lei de Trabalho Temporário (Lei 6.019/74). 

Após essa tímida incorporação, a terceirização passou aos poucos a ganhar espaço no Direito do Trabalho, sendo que no ano de 1983 foi criada a Lei 7.102 que autorizou a contratação de terceiros para atuarem como seguranças bancários, sendo liberado posteriormente à contratação de segurança em geral. 

Com o passar do tempo, o assunto foi amplamente inserido no Direito do Trabalho e pacificado pelo Tribunal Superior do Trabalho ao editar em 1980 a súmula 256 que foi revisada em 1993 dando vida a súmula 331 que tratou do tema, com apenas mais uma edição em 2011 até a chegada da Reforma Trabalhista em 2017. 

A súmula 331 do C. TST, em seu inciso III pacificou o entendimento jurisprudencial sobre as formas lícitas de terceirização à época, vejamos: 

 

“CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). 

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). 

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. 

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. 
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. 

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.” 

Como é possível observar, a súmula supra autorizou a contratação de terceiros nas atividades-meio das empresas, ou seja, aquelas que não são ligadas à atividade principal, desde que não haja pessoalidade e subordinação direta entre o tomador e o trabalhador terceirizado. 

Aqui, cabe esclarecer que a pessoalidade e subordinação são dois dos requisitos caracterizadores de vínculo empregatício entre empregado e empregador, por isso alocados à sumula como regra para validade do contrato terceirizado, uma vez que caso sejam encontrados esses requisitos na relação à terceirização será considerada ilícita. 

Dessa forma, o tomador de serviços possui autorização para contratar vigilantes, faxineiros entre outros da empresa prestadora dos serviços, desde que o trabalhador terceirizado não tenha pessoalidade, ou seja, personalidade (somente aquele empregado pode executar a tarefa, não sendo possível substituir por outro) e subordinação direta pelo tomador, isto é, seu superior hierárquico precisa estar ligado à empresa prestadora dos serviços, não sendo permitido que seja um funcionário direto do tomador. 

No entanto, passados alguns anos do tema ser pacificado na jurisprudência trabalhista, em 2017 a Lei 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista, passou a autorizar a contratação de terceiros também para a atividade-fim, quando alterou o artigo 4º A da Lei do Contrato Temporário (6.019/74) para constar:  

Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução. 

Com a chegada da Reforma, restou clara a possibilidade de terceirização da atividade-fim, sendo preservado apenas a ausência de subordinação direta, conforme parágrafo único do artigo 4º A da Lei 6.019/74 para validação da contratação. 

Em que pese os inúmeros entendimentos contrários a essa aprovação, no sentido de que referida autorização precariza os direitos dos trabalhadores e com real objetivo de invalidar essa inovação, em agosto de 2018 o Supremo Tribunal Federal se posicionou sobre o assunto ao julgar o tema 725 de repercussão geral, destacando ser “lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas…”. 

Evidente que referido posicionamento do STF veio para sedimentar a permissão já concedida acerca da terceirização de atividade-fim, no entanto, esse ainda é um tema muito delicado para as empresas, uma vez que até hoje o assunto é discutido com ênfase nos Tribunais. 

A par disso, no final do último ano (2023) o STF se posicionou novamente pela validade da terceirização da atividade-fim, modulando apenas seus parâmetros, destacando que valores recebidos por trabalhadores até agosto de 2018 em ações cuja alegação era de nulidade da terceirização na atividade-fim são considerados de boa-fé, não sendo passível ação rescisória para restituição de valores à empresa, inclusive pelo decurso do prazo de dois anos após o trânsito em julgado da ação. 

Assim, é fato notório que este ainda é um tema quente no dia a dia do Direito do Trabalho, até mesmo pelas interpretações jurisdicionais contrárias a Corte que ainda são aplicadas no âmbito da Justiça do Trabalho causando muita insegurança jurídica as partes e aos operadores do direito. 

Por essa razão, é de suma importância que a empresa conte com uma equipe jurídica qualificada na avaliação dessas decisões e tenha ciência de todos os riscos, inclusive da possibilidade de nulidade da terceirização que gera vínculo direto entre empregado e tomador de serviços. 

 

Referência 

Delgado, Maurício Godinho. CURSO DE DIREITO DO TRABALHO. 20ª Ed. São Paulo, 2023.