Por Lucas Eduardo Bagatin Ribeiro
A impenhorabilidade do salário quase sempre foi indiscutível, porém, com o passar do tempo essa regra foi sendo cada vez mais relativizada, de modo a viabilizar ao credor a possibilidade de, em determinadas hipóteses, pleitear a penhora de um percentual dos recebimentos do devedor, a fim de buscar a satisfação da dívida.
Essa relativização começou no Código de Processo Civil de 1973, que estabelecia a possibilidade da penhora do salário para pagamento de prestação alimentícia (art. 649, § 2º) e foi ampliada no Código Processual Civil de 2015, que acrescentou a hipótese em que o devedor recebesse importâncias acima de 50 salários-mínimos mensais.
No entanto, esta segunda hipótese gerou muitas controvérsias, tendo em vista que uma porcentagem muito baixa da população brasileira recebe valores acima de 50 salários-mínimos, que na cotação atual seria mais que R$ 66.000,00, tornando praticamente ineficaz essa hipótese de penhora.
A questão foi objeto de discussão até mesmo no Superior Tribunal de Justiça. Enquanto a 4ª Turma se apoiava na legislação abstrata, entendendo que somente seria possível a penhora quando os valores recebidos fossem superiores a 50 salários, a 3ª Turma entendia que era possível a penhora independentemente da remuneração, desde que a medida não comprometesse a subsistência digna do devedor.
Diante da controvérsia, a Corte Especial do STJ pacificou o entendimento de que “é possível a relativização da regra da impenhorabilidade das verbas para pagamento de dívida não alimentar, independentemente do montante recebido pelo devedor, desde que seja preservado o montante que assegure sua subsistência digna” (EREsp nº 1.874.222/DF).
Passados alguns meses da decisão, os Tribunais têm citado em seus julgados o precedente da Corte Especial cada vez com mais frequência.
A título de exemplo, os desembargadores da 36ª Câmara de Direito Privado do TJSP1, reverteram, com base no julgamento do STJ, decisão que havia negado a penhora de 30% do salário de um devedor.
D’outro lado, no Rio de Janeiro, a 4ª Câmara de Direito Público2 decidiu não penhorar uma parte do salário de uma devedora. Para o relator, não se desconhece o entendimento firmado pela Corte Especial do STJ, contudo, no caso concreto, a penhora do salário não se mostrava razoável de modo que a constrição não iria garantir uma subsistência digna da devedora.
Observa-se que os Tribunais estão seguindo o entendimento firmado pelo STJ, mas sempre com uma análise aprofundada em cada caso concreto, especialmente a fim de observar se a medida constritiva sobre o salário não causará prejuízo a subsistência do devedor.