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A tragédia humanitária do Rio Grande do Sul e seu reflexo sobre o mercado de seguros

A tragédia humanitária do Rio Grande do Sul e seu reflexo sobre o mercado de seguros

Escrito por João Pedro Ferraz Delgado . 11 . 06 . 2024 Publicado em Artigos

Por João Pedro Delgado 

As enchentes que assolam o Rio Grande do Sul já podem ser consideradas como uma das maiores tragédias naturais de nosso país, e também o sinistro mais caro para a indústria seguradora brasileira, podendo, inclusive, ultrapassar os danos causados pelo Furacão Katrina, ocorrido no sudeste dos Estados Unidos em 2005. A tragédia com certeza terá impacto na economia nacional, posto que o Estado é o quarto maior PIB do país, e por consequência o quarto maior contribuidor com a Fazenda Nacional. 

Até o momento apurou-se que mais de 2 milhões de pessoas foram afetadas pela tragédia, causando mais de 150 mortes confirmadas, 100 desaparecimentos, além de mais de 600 mil desabrigados, todavia, a devastação, que já ultrapassa 3 semanas, não possui previsão de término. 

Diante da destruição, o setor de seguros possuirá papel crucial na reconstrução do Estado, uma vez que o Rio Grande do Sul possui o maior percentual de seguros residenciais do país, havendo expectativa de que o número aumente após a normalização da situação, embora as opções que possuem cobertura sobre eventos extremos, como enchentes, sejam mais onerosas e comumente não contratadas, o que certamente ocasionará discussões judiciais. 

Sob esta ótica, como já adotado em outras tragédias que abalaram o mundo, além das iniciativas governamentais, institucionais e empresariais, mostra-se como alternativa para a mitigação dos danos causados, a criação de fundos humanitários para pagamento, inclusive de indenizações, com a participação de resseguradores locais e internacionais, de forma a evitar uma onda de litígios judiciais que possam vir a ocorrer. 

Referida prática foi adotada à época da tragédia envolvendo o time da Chapecoense, em 2016, em que mesmo que a apólice de seguro da companhia aérea não teria garantia, devido a descumprimento de diversas condições contratuais, os resseguradores, dada a gravidade da situação e comoção, por liberalidade criaram um fundo de assistência, auxiliando financeiramente os sobreviventes e familiares e herdeiros dos falecidos. 

No entanto, a criação dos fundos humanitários deve se atentar à essencialidade de atrelar eventuais pagamentos à quitação recíproca, como no caso de beneficiários que não possuiriam direito a indenizações por ausência de cobertura, de forma a evitar posterior judicialização, haja vista que existem casos em que eventual cláusula de exclusão de responsabilidade em hipóteses de sinistros causados por força maior, em que se encaixam fenômenos naturais, foi afastada, em aplicação do Código de Defesa do Consumidor. 

Desta forma, se não adotada a criação dos fundos humanitários, ainda que com histórico positivo, e não se pense em outro formato de resolução das demandas que surgirão, como ações civis públicas, por exemplo, de certo haverá um crescimento exponencial de demandas judiciais envolvendo seguradoras, que exigirá preparo do Poder Judiciário da região e das próprias seguradoras.