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(Português) Loteamento, loteamento de acesso controlado e condomínio horizontal de lotes: será mesmo que eu moro em um “condomínio fechado”?

(Português) Loteamento, loteamento de acesso controlado e condomínio horizontal de lotes: será mesmo que eu moro em um “condomínio fechado”?

Written by Mathews Scheffer Rodrigues . 11 . 10 . 2023 Published in Articles

(Português) Por Mathews Scheffer Rodrigues 

 

Não são raras as vezes em que nos deparamos com alguém falando que mora em um “condomínio fechado”. Embora, no dia-dia, a nomenclatura não faça tanta diferença, o que usualmente se chama de “condomínio”, na verdade, pode ter sido constituído como um “condomínio horizontal de lotes”, como um “loteamento” ou como um “loteamento de acesso controlado”. 

Para entender melhor sobre o tema, é necessário remontar ao ano de 1979, quando, pela Lei 6.766, em um momento de exponencial crescimento da urbanização no Brasil, para organizar a expansão das cidades, foi instituído o chamado “parcelamento do solo urbano”, a ser realizado mediante “desmembramento” ou “loteamento”. 

No que interessa para este texto, a referida Lei esclarece que o “loteamento” é a subdivisão de um “terreno” em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. 

Vale notar que a Lei de Parcelamento, naquele momento inicial, não previa a possibilidade de fechamento dos loteamentos, o que fez com que os moradores, loteadores e demais interessados viessem a buscar alternativas. Tamanha a demanda nesse sentido que diversas cidades passaram a autorizar a construção de muro ao redor do loteamento, e implementação de controle de acesso, mediante leis e/ou decretos municipais. 

Não à toa, causa surpresa o fato de que o “condomínio fechado” tenha sido formalmente legalizado apenas em 2017, com a promulgação da Lei 13.465, que trouxe expressamente as figuras do “condomínio horizontal de lotes” e do “loteamento de acesso controlado”. 

Mas, afinal, no que esses institutos se diferenciam? 

O “condomínio”, em sua essência, significa propriedade conjunta, ou copropriedade (com = “junto” + dominium = “poder sobre”). No Direito Brasileiro existem algumas espécies de “condomínio”, destacando-se entre elas o “condomínio edilício”, comumente visto na figura dos edifícios. Nele, conforme dispõe o artigo 1.331, do Código Civil, existem partes de propriedade exclusiva (apartamentos) e partes de propriedade comum dos condôminos (áreas comuns). 

O “condomínio horizontal de lotes”, trazido pela Lei 13.465/2017, é uma derivação do “condomínio edilício”, vez que, assim como ele, prevê partes de propriedade exclusiva (lotes) e partes de propriedade comum dos condôminos (vias, praças, áreas de lazer) – art. 1.358-A, do Código Civil. 

Há quem diga, nesse ponto, que a Lei 13.465/2017 não se trata de inovação legislativa, vez que o “condomínio deitado” teria sido criado, na verdade, pela Lei 4.591/1964. Essa lei, inclusive, foi bastante utilizada para justificar a aprovação de condomínio de lotes antes da promulgação da Lei 13.465/2017. 

N’outro passo, o loteamento, conforme mencionado, foi uma ferramenta criada para organizar a expansão das cidades. Em seu projeto de instituição, que deve ser aprovado pelo Poder Público, há a previsão de destinação das áreas exclusivas para particulares (lotes), das áreas institucionais (áreas de lazer, por exemplo) e das áreas públicas (vias, praças, ruas). 

Nesse ponto, vale notar, por seu um instrumento de organização das cidades, seu objetivo era ser aberto, com áreas comuns e acessíveis para toda a população. E a criação do “loteamento de acesso controlado”, que legalizou de vez o fechamento dos loteamentos, também através da Lei 13.465/2017, não modificou essa natureza. 

Ou seja, de maneira macro, a diferença básica entre o “loteamento” e o “condomínio” reside no fato de que o primeiro, por exigência legal, vê serem inseridas em suas dependências áreas públicas, pertencentes ao Município onde está localizado. No “condomínio” todas as áreas, em regra, são de particulares. 

Em razão disso, é inegável que, no condomínio, no que se refere às áreas comuns, todos os condôminos deverão suportar as despesas de manutenção e conservação, pois são eles os proprietários dessas áreas compartilhadas. No loteamento, por sua vez, por muito tempo houve discussão acerca da cobrança, ou não, de taxas de conservação das áreas comuns, visto que pertencentes ao Poder Público. 

Por esse motivo, aliás, era muito comum que as associações de moradores firmassem contratos de cessão de direito de uso das áreas públicas inseridas no loteamento com a Municipalidade, puxando para si a obrigação de manutenção e conversação das áreas comuns. 

Sobre a cobrança das taxas em loteamentos, o C. STF, recentemente, estabeleceu que, até o advento da Lei nº 13.465/2017, ou de anterior Lei Municipal que disciplinasse a questão, era inconstitucional a cobrança realizada em face de moradores não associados. A partir do advento da mencionada Lei, passou a ser válida a cobrança, desde que “i) já possuidores de lotes, tenham aderido ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis ou, ii) no caso de novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis”. 

Nesse ponto, é incontestável que nem com a Lei 13.465/2017, e tampouco com a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, houve uma resolução satisfatória da questão. A título de exemplo, questiona-se: i) os já possuidores de lotes que se desassociem após o advento da Lei poderão ser cobrados? ii) para eficácia da cobrança dos novos adquirentes, os atos constitutivos da associação de moradores deverão ser averbados em todas as matrículas dos lotes? 

Mesmo com definições objetivas, tanto as associações de moradores que pretendem realizar as cobranças de taxas de manutenção das áreas comuns do loteamento, como também os moradores que pretendem se isentar desse dever, estão à mercê da interpretação do juiz afeto à sua causa.