(Português) Por Francine da Silva Polez
As relações de trabalho no Brasil têm sido objeto de intensos debates, especialmente com o advento de novas formas de organização produtiva. Fenômenos como a pejotização e a uberização têm desafiado os limites da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), suscitando questionamentos sobre a natureza dessas relações e a competência para analisá-las. O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do Tema 1.389, tem desempenhado papel crucial na definição do tratamento jurídico dessas práticas.
O que é Pejotização?
A pejotização consiste na prática em que o empregador exige que o trabalhador constitua uma pessoa jurídica (PJ) para formalizar a relação de trabalho, substituindo o vínculo empregatício tradicional. Essa estratégia visa, muitas vezes, reduzir custos com encargos trabalhistas e previdenciários, além de flexibilizar a gestão de pessoal. No entanto, quando utilizada para mascarar uma relação de emprego, caracterizando fraude, a pejotização torna-se ilegal.
O que é Uberização?
A uberização refere-se à organização do trabalho mediada por plataformas digitais, como Uber e iFood, onde motoristas e entregadores atuam como autônomos, sem vínculo empregatício formal. Esse modelo de trabalho tem sido amplamente adotado em diversos setores, caracterizando-se pela flexibilidade e pela intermediação tecnológica. Contudo, surgem questionamentos sobre a existência de subordinação nas relações estabelecidas por essas plataformas, o que pode configurar vínculo empregatício.
O Tema 1.389 do STF: Repercussão Geral sobre Pejotização
O STF, no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.532.603, reconheceu a repercussão geral sobre a licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, a chamada “pejotização”. A decisão do ministro Gilmar Mendes determinou a suspensão nacional de todos os processos que tratam da licitude desses contratos até o julgamento definitivo pelo Plenário. A medida visa conter o crescente número de reclamações constitucionais originadas por decisões da Justiça do Trabalho que, em variados graus, deixam de aplicar a orientação do STF sobre a liberdade de organização produtiva e divisão contratual do trabalho.
O ARE 1.532.603 aborda três aspectos centrais: (i) a competência da Justiça do Trabalho para julgar ações que discutem a existência de fraude em contratos civis ou comerciais de prestação de serviços; (ii) a licitude da contratação de pessoa jurídica ou trabalhador autônomo para essa finalidade; e (iii) a definição de quem deve arcar com o ônus da prova nessas situações.
O Impacto da Decisão do STF
A decisão do STF sobre o Tema 1.389 tem implicações significativas para o cenário trabalhista brasileiro. Ao reconhecer a licitude da pejotização, desde que não haja fraude, o STF sinaliza uma flexibilização nas relações de trabalho, alinhando-se aos princípios da livre iniciativa e da autonomia da vontade. Entretanto, essa postura também levanta preocupações quanto à proteção dos direitos trabalhistas e ao financiamento da seguridade social, diante da possibilidade de redução da arrecadação previdenciária.
Além disso, a suspensão dos processos relacionados à pejotização busca uniformizar o entendimento jurídico sobre o tema, evitando decisões conflitantes e promovendo segurança jurídica para empregadores e trabalhadores.
Considerações Finais
A pejotização e a uberização representam novas formas de organização do trabalho que desafiam o ordenamento jurídico tradicional. O STF, por meio do Tema 1.389, tem buscado equilibrar a liberdade contratual com a necessidade de proteção dos direitos trabalhistas. O julgamento definitivo desse recurso extraordinário será fundamental para consolidar o entendimento da Corte sobre a licitude dessas práticas e a competência para analisá-las, influenciando diretamente o futuro das relações de trabalho no Brasil.