Por Lucas Eduardo Bagatin Ribeiro
O Supremo Tribunal Federal deve começar a julgar dois recursos extraordinários (RE 979.742 e RE 1.212.272) que discutem se a liberdade religiosa de uma pessoa justifica o pagamento de um tratamento de saúde diferenciado pela União (SUS) e se tal direito permite ao cidadão exigir ou recusar certos procedimentos cirúrgicos.
Os recursos serão julgados no Tema 952, de Repercussão Geral, e ambos envolvem pessoas cuja religião não permite a transfusão de sangue e, por isso, buscaram formas de realizar cirurgias sem o procedimento sob o argumento de proteção à liberdade religiosa.
No RE 979.742 será analisada decisão que condenou a União e Município a garantirem a realização de cirurgia de artroplastia, sem transfusão de sangue, em razão da opção religiosa do paciente, enquanto no RE 1.212.272 será julgado recurso contra decisão que impediu uma paciente, também em razão da religião, a fazer cirurgia para substituição de válvula aórtica, sem transfusão de sangue.
A Repercussão Geral dos recursos foi reconhecida em 2019 pelo Ministro Gilmar Mendes, que destacou o direito de autodeterminação das Testemunhas de Jeová em exigir tratamento médico sem transfusão de sangue é uma discussão de “inegável relevância”.
A Procuradoria Geral da República defende que o paciente possa recusar tratamento médico por motivos religiosos, desde que ausente risco à saúde pública e à coletividade, além disso, sugere ser possível a realização de procedimento cirúrgico sem transfusão, desde que haja viabilidade técnico-científica, anuência da equipe médica e decisão inequívoca do paciente.
Nesse ponto, é importante destacar que a Resolução nº 2.232/2019 do Conselho Federal de Medicina prevê que o médico não deve aceitar a recusa terapêutica de paciente menor de idade, em situações de risco relevante à saúde (artigo 3º).
Seguindo esse mesmo sentido, o artigo 11º da Resolução estabelece que “em situações de urgência e emergência que caracterizarem iminente perigo a vida, o médico deve adotar todas as medidas necessárias e reconhecidas para preservar a vida do paciente, independentemente da recusa terapêutica”.
De qualquer forma, o julgamento dos recursos poderá solucionar discussões que perduram por longo tempo a respeito da recusa pelo paciente de tratamentos médicos por motivos religiosos.